Marlene de Oliveira
passou em 12º lugar para Economia na UFSJ.
Ela lutou sete anos
contra o transtorno esquizoafetivo.
Muitos ingressam em
um curso superior para ter uma profissão. Para Marlene Aparecida de Oliveira,
moradora de Ouro Branco, na Região Central de Minas Gerais, ser aprovada no
vestibular representou a recuperação da dignidade e da autoestima. Aos 48 anos,
ela vai estudar economia na Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ),
mesma instituição onde sua filha mais nova, Karina Giancotti, graduou-se em
engenheira elétrica. “Foi ótimo. Quem diria que ela iria passar?”, conta a
caçula recém-formada.
Marlene decidiu que
era hora de voltar a estudar depois de lutar contra um tipo de transtorno
psiquiátrico. “Foram sete anos, eu falava coisas que as pessoas não
compreendiam. Era como se eu falasse uma língua que não dava para entender uma
palavra”, relembra a caloura.
Nascida na cidade de
Califórnia, no Paraná, Marlene mudou-se para Minas Gerais em 1992 para
gerenciar uma mineradora de pequeno porte. Com a doença, Marlene se viu
obrigada a interromper a carreira. “Passei sete anos sendo chamada de maluca,
na verdade, sou chamada até hoje”, afirma. Depois de várias tentativas, ela
encontrou o tratamento certo e pode retomar sua vida. Para ganhar dinheiro,
chegou a fazer faxina em diversas casas de estudantes em Ouro Branco.
Marlene se tratou do
chamado transtorno esquizoafetivo. O psiquiatra João Vinícius Salgado, que
acompanhou parte do tratamento dela, explica que o paciente com este quadro
pode apresentar alterações de comportamento e delírios motivados ou não por
quadro de humor. “Pequena parcela desses doentes consegue ter uma vida plena,
ter emprego e constituir uma família por causa da gravidade dos sintomas e da
ausência atualmente de tratamento que seja satisfatório”, disse.
Mas ela conseguiu
driblar algumas limitações e se propôs a realizar o sonho de fazer um curso
superior, que vinha desde os tempos da adolescência. Foi aí que procurou um
supletivo. Não foi na primeira tentativa que Marlene garantiu uma vaga na
universidade, mas, apesar disso, não desistiu. Conseguiu uma das disputadas vagas em cursinho da
prefeitura de Ouro Branco e seguiu firme nos estudos. (O cursinho não precisa ter nome e nem ser caro, o aluno é que tem que ser determinado. Comentário Ciro Rod)
Rotina regrada
A caloura tinha uma
rotina bem regrada, apesar de revelar que não acordava muito cedo. Todos os
dias, por volta da 1h, ela ia até o ponto de ônibus esperar a filha caçula
Karina chegar das aulas de Engenharia Elétrica na UFSJ, que fica a cerca de
2h30 de viagem de Ouro Branco. No cursinho, Marlene se sentava na frente para
escutar bem os professores e relia o conteúdo em casa. “Fiz alguns amigos no
pré-vestibular, mas estava lá para cumprir meu objetivo. Eu gosto de estudar,
não acho um sacrifício. Quero estudar muito ainda”, explica.
O empenho teve como
recompensa a aprovação em 12º lugar. Para Marlene, essa vitória deve ser
dedicada a muitas pessoas, além das filhas. Segundo ela, os verdadeiros amigos,
que deram apoio durante a doença, e o médico responsável pelo tratamento foram
fundamentais.
Uma das limitações do
transtorno é o déficit cognitivo, que pode comprometer o aprendizado. Segundo o
psiquiatra, alterações biológicas, uso inadequado de medicação e falta de
estímulo justificariam esse déficit. Como explica Salgado, o portador pode
apresentar quadro de perda de vontade e, por vezes, acaba sendo isolado no
convívio social.
A doença desafia a
ciência, que pesquisa as prováveis causas e busca a cura. “Normalmente a doença
aparece no fim da adolescência e início da idade adulta. Por que exatamente,
não se sabe. Pode estar relacionado à predisposição biológica, que associada a
fatores adquiridos ao longo da vida, fazem eclodir a doença”, afirma Salgado. O
transtorno esquizoafetivo, segundo o médico, pode ser controlado com medicação
e psicoterapia. Um momento de superação, como o que foi vivido por Marlene,
ajuda a recuperar a autoestima e favorece o tratamento.
A caloura do curso de
economia vai se empenhar pelos próximos cinco anos não só para se deslocar
entre Ouro Branco e São João del Rei. Ela quer se esforçar para fazer algo que
valha à pena. “Eu adoraria fazer uma coisa super diferente. Eu sempre acreditei
que podia mudar a vida das pessoas para melhor. Acredito em solidariedade
porque eu tive muita”, planeja.
Fonte: http://g1.globo.com
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