Quanto maior a remuneração e o poder de decisão dos cargos de confiança no governo federal, menor é o porcentual de ocupação por servidoras; barreira é mais evidente em ministérios de perfil técnico, afirma especialista
Dilma Rousseff, a primeira mulher a governar o Brasil, assumirá o comando de uma máquina administrativa majoritariamente masculina e que impõe um "teto de vidro" para a ascensão profissional das funcionárias públicas. Quanto maior o salário e a responsabilidade do cargo, menor é a proporção de ocupantes do sexo feminino.
No quadro de todos os 578 mil servidores civis ativos do governo federal, as mulheres ocupam 45% dos empregos, apesar de serem 51% da população brasileira. Em toda a Esplanada dos Ministérios, apenas quatro pastas têm mais funcionárias que funcionários (veja quadro).
Mas é na estrutura de distribuição dos 21,6 mil cargos de direção e assessoramento superior (DAS), nos quais está a elite do funcionalismo público, que o predomínio masculino fica evidente. As mulheres são 46% dos ocupantes dos cargos DAS-1, com menor remuneração e poder de decisão, mas apenas 23% dos postos DAS-6, no topo da pirâmide salarial.
Obstáculo. A situação ilustra com precisão a metáfora do "teto de vidro", adotada por especialistas em mercado do trabalho e feministas para descrever a barreira invisível, mais cultural que institucional, que mantém as mulheres em posição de desigualdade tanto no setor público quanto no privado.
"No mercado de trabalho, as mulheres vão até um certo patamar, mas acabam relegadas a um segundo plano quando se trata de cargos mais importantes", afirma Sônia Malheiros Miguel, secretária de Articulação Institucional da Secretaria de Políticas para as Mulheres - órgão vinculado à Presidência da República. "Não é a toa que se diz, no mundo todo, que a grande barreira a ser vencida pelas mulheres no século 21 é a ocupação de espaços de poder e decisão."
Maria Aparecida Abreu, pesquisadora do Ipea e autora de estudos sobre desigualdade de gênero, observa que o predomínio masculino é maior ou menor conforme a área do governo. "Há uma série de convenções sobre papéis masculinos e femininos que se reproduzem na estrutura mais alta de cada ministério", diz ela.
Assim, em órgãos da área social, relacionados aos cuidados com os outros, a presença feminina é mais acentuada. "No Ministério do Desenvolvimento Social, por exemplo, as mulheres são maioria nos cargos de chefia", observa a pesquisadora. "Já no Ministério da Fazenda, de perfil mais técnico, a proporção é muito pequena."
Segundo Maria Aparecida, uma das hipóteses para se explicar o predomínio masculino nos postos de chefia é o fator disponibilidade. "Os cargos DAS-5 e DAS-6 demandam dedicação quase exclusiva ao trabalho, com horário e jornada imprevisíveis. Isso faz com que um ministro pense duas vezes antes de nomear uma mulher. Existe a percepção de que ela ainda terá de cuidar da casa e de filhos."
Sônia Malheiros vê outra razão: "Para as mulheres ocuparem esses espaços de poder e decisão, homens terão de sair. E aí existe uma resistência muito grande", afirma (leia entrevista nesta página).
Futuro promissor. Apesar de apontar as dificuldades de superação das barreiras para a ascensão profissional das mulheres no setor público, as duas especialistas projetam um cenário mais igualitário no futuro.
"O nível de escolaridade das mulheres já é maior que o dos homens, embora elas ainda se concentrem mais nas áreas de pedagogia, literatura e cuidados de saúde", afirma Maria Aparecida, do Ipea. "A tendência é caminharmos para um quadro mais paritário."
"A eleição de uma mulher para a Presidência abre condições de avançar no sentido de um equilíbrio maior na divisão do poder na sociedade", avaliou a secretária Sônia Malheiros.
Fonte: http://www.estadao.com.br
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