O paulista Eduardo Alcalay desembarcou no Rio de Janeiro em dezembro de 2008 com uma missão inédita em sua carreira. Aos 41 anos de idade, dez deles passados no banco Garantia e na GP Investimentos, a maior gestora de fundos de private equity do país, Alcalay sempre atuou nos bastidores. No mítico banco criado por Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, coordenou operações importantes, como a venda da Kolynos à Colgate, a venda da Lacta à Kraft e a compra das operações da Pepsi na América Latina pela AmBev (então Brahma). Na GP, onde é sócio desde 2005, foi o responsável por aquisições como a da mineira Magnesita, um negócio de 1,2 bilhão de reais fechado em 2007. As articulações de grandes fusões e aquisições, porém, ficaram em segundo plano desde que ele assumiu a presidência da universidade fluminense Estácio de Sá - sua primeira experiência no comando de uma empresa. Desde maio de 2008, quando a GP pagou 259 milhões de reais para arrematar 20% da universidade (um negócio conduzido pelo próprio Alcalay), a Estácio logo se tornou uma das maiores apostas da gestora - sobretudo pelo enorme potencial de crescimento do setor de educação. Essa expectativa de retorno nunca foi tão alta quanto agora. Em junho, a GP amargou um prejuízo de 140 milhões de dólares ao vender a Imbra, empresa de serviços odontológicos adquirida em outubro de 2008. Em outra frente, a gestora luta para reestruturar a San Antonio, especializada em perfuração de poços de petróleo - comprada por 1 bilhão de dólares em agosto de 2007, a companhia perdeu quase 70% de seu valor desde a compra até março, quando foi divulgado o último resultado. Esses maus investimentos fizeram com que as ações da GP caíssem cerca de 30% neste ano - e levaram o mercado a acompanhar o desempenho da Estácio, a terceira maior empresa em valor de mercado entre as dez do portfólio da GP, com atenção redobrada. "Essa tem que dar certo", diz o próprio Alcalay, resumindo o estado de espírito dos sócios da gestora.
A tarefa do executivo é particularmente espinhosa porque a Estácio vem perdendo fôlego nos últimos anos. Fundada em 1970 pela família Uchoa, que ainda detém 52,6% de participação, a Estácio tornou-se a maior empresa de ensino superior do país no final dos anos 90. Embora tenha mantido o posto por uma década, a empresa viu sua principal concorrente - a paulista Anhanguera - avançar a passos largos. Nos últimos três anos, enquanto a Estácio aumentou em apenas 15% o número de matrículas, a Anhanguera quintuplicou seu total de estudantes, roubando a liderança no ano passado (em número de alunos). Paralelamente, a falta de sistemas eficientes de controle de custos e de cobrança fez a Estácio colecionar maus pagadores e perder rentabilidade. Hoje, a margem de lucro da Estácio é de 12%, a menor entre as companhias abertas do setor. No final de 2009, depois de analisar a situação dos inadimplentes, a universidade teve de reconhecer em balanço um calote de 60 milhões de reais em mensalidades atrasadas. "A Estácio possuía escala, mas não conseguia tirar vantagem disso", diz Vitor Pini, analista do Bradesco.
Para reverter esse cenário, uma das primeiras medidas do executivo foi cortar custos. Até maio do ano passado, cada um dos 73 campi possuía os próprios departamentos financeiro, jurídico e de compras. Hoje, todos os serviços administrativos estão centralizados na sede da empresa. Também foi extinta mais da metade dos cargos de direção - dos 219 restaram 90. No total, a "limpeza" promovida pelo sócio da GP eliminou quase 1.500 dos antigos 5.700 funcionários administrativos. Ao mesmo tempo, a empresa iniciou uma ofensiva para melhorar sua imagem e aumentar o alcance da marca, num investimento de cerca de 50 milhões de reais. No início de 2009, o apresentador Luciano Huck foi contratado como garoto- propaganda de uma campanha publicitária veiculada nos 16 estados em que a Estácio opera. Em maio, a universidade estreou uma nova campanha de televisão com depoimentos de jovens dizendo que se formaram na Estácio e são profissionais bem-sucedidos. Essas medidas já trouxeram alguns resultados. O mais visível deles foi o aumento do lucro, da ordem de 9% no ano passado, depois de uma queda de 1% em 2008.
A intervenção mais profunda, no entanto, começou a ser executada apenas neste ano. O número de cursos oferecidos caiu quase pela metade, de 140 para 78. Foram cortadas graduações, digamos, exóticas, como administração de Carnaval. Das que restaram, em 41 delas foi adotado um sistema em que disciplinas comuns são compartilhadas por alunos de cursos diferentes. Desde agosto do ano passado, a rede lançou 24 cursos de graduação e pós a distância para ganhar mais alunos e manter os custos baixos. Hoje há 16.000 alunos matriculados na Estácio em cursos a distância, representando 3% do faturamento total da empresa. Mas o potencial de crescimento dessa modalidade de ensino é enorme. A estimativa é que o número de estudantes a distância no ensino superior chegue a 1,4 milhão em todo o país em 2012, quase um terço de todas as matrículas da rede privada. A Anhanguera, que entrou nesse mercado em 2007, possui 130.000 alunos em cursos a distância - 40% de toda a sua base de estudantes. "É disparado o segmento que mais cresce", diz Ricardo Scavazza, diretor de relações com investidores da Anhanguera.
Uma eventual retomada da liderança deve passar também pela compra de concorrentes. Em janeiro, Alcalay montou um time com três especialistas em fusão e aquisição. A equipe mapeou 130 instituições de ensino que, juntas, somam 600.000 alunos e seriam potenciais alvos de aquisição. A meta é aumentar o número de alunos em 120.000 com as aquisições. "A essa altura, já deveria ter fechado algum negócio", diz Alcalay. A pressa se explica em grande medida pelo aquecimento do setor de educação no país. O grupo mineiro Kroton, terceiro maior do país, comprou a rede mato-grossense Iuni no início deste ano e dobrou de tamanho. Em julho, houve duas outras operações. A Abril Educação (empresa do Grupo Abril, que edita EXAME) anunciou a compra do grupo Anglo e se tornou a segunda maior rede de sistema de ensino do país. O grupo inglês Pearson comprou parte do SEB, dono das escolas COC. A Anhanguera planeja triplicar o número de estudantes em cinco anos, especialmente por meio de aquisições. Ninguém vai ter vida fácil daqui em diante - disso Alcalay não tem a menor dúvida.
Fonte: http://portalexame.abril.com.br
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